quarta-feira, 18 de julho de 2012

CRIANÇAS SAUDÁVEIS

 


Mãe, me dá agrião?




Por Manoella Oliveira


Quem já levou criança ao supermercado sabe que elas pedem muitas coisas e que, por mais extensa que seja a lista, sobra pouco espaço para os alimentos saudáveis. Salgadinhos, balas, chocolates e guloseimas cheias de corantes artificiais são os campeões de votos, mas é bem possível que o brócolis tenha seu lugar no prato dela – e com louvor. Talvez ela não implore por ele, mas pode comer o vegetal com frequência e achar uma delícia. Não se trata de mágica ou de sorte, mas de saber como conduzir o processo de educação alimentar.
Segundo recomendação do Ministério da Saúde, o bebê deve se alimentar exclusivamente de leite materno até os seis meses. Comidinhas e água só devem ser introduzidos a partir de então, salvo nos casos em que a mãe esteja impossibilitada de amamentar ou haja uma recomendação médica para começar alimentação complementar antes deste período.
Ao iniciar o desmame, o ideal é introduzir todos os tipos de alimentos, gradativamente, seguindo a velha regra do “prato colorido”, uma orientação simples, mas eficiente para garantir a presença dos mais variados nutrientes na refeição. “Quando for oferecer pela primeira vez, não é aconselhável misturar, mas dar somente um tipo de alimento a cada colherada. Assim, a criança desenvolverá seu paladar com aquele determinado sabor. De acordo com a faixa etária e aos pouco, é bom alterar a consistência, para que a criança se adapte às sensações de cada alimento, como a diferença entre a maciez de um purê de batata e a firmeza de um pedaço de batata bem cozida.”
Quando a criança tiver conhecido o sabor de um alimento e experimentado suas variações, é hora de misturá-lo, deixando-o bem semelhante ou até igual às demais refeições da casa. Ela ressalta, no entanto, a necessidade de preservar o hábito de oferecer o alimento, separadamente. “É importante para verificar se a criança tem alguma alergia ou intolerância. Em caso de dúvidas, o melhor a fazer é procurar um nutricionista que irá analisar e adequar a alimentação”.
A variedade de cores é a regra básica, mas é preciso atentar para as especificidades dessa fase. “É fundamental, na infância, o bom aporte de ferro (encontrado em carnes, feijão e verduras verde-escuras), cálcio (encontrado em leite e derivados e verduras verde- escuras) e vitamina C (encontrado em frutas, cítricas principalmente, verduras e legumes de uma maneira geral).” 


E SE ELE FIZER CARETA?

Às vezes, a criança rejeita, fecha a boca e vira o rosto para desviar da colher que insiste em vir em sua direção. Muitas vezes essa é a reação de quem experimentou e não gostou, outras tantas é o movimento de quem nem se animou a provar. “É comum que elas rejeitem os alimentos amargos e azedos, dando preferências aos mais doces porque, assim como acontece com os adultos, estes geram sensação de bem-estar.”
Não foi o caso do pequeno Igor que, ao primeiro contato com a alface, mastigou e engoliu com a melhor cara do mundo. “Ele pegou a alface, examinou, trocou de mão, rasgou e resolveu colocar na boca. Na verdade, ele faz isso com qualquer coisa que pegue: analisa, observa, bate em outra coisa e depois vai para boca. Na hora, achei que ele fosse fazer cara feia e cuspir, jogar fora, sei lá. Mas ficou empolgadíssimo comendo a folhinha”, conta a mãe, Viviane Davico. A providência imediata do casal, quando o menino já estava na segunda folha de alface foi correr para pegar uma câmera, um celular e filmar. “Para mostrarmos para ele, quando ele tiver 10 anos e disser que não gosta de alface”.
Igor, que hoje tem 11 meses, se alimentou exclusivamente de leite materno até os seis, idade em que aconteceu o episódio. “Como ele ainda estava começando a comer comidinhas, achei que o gosto, a textura, tudo ia ser muito diferente para ele e ele não ia gostar. Acho que ele não distingue o que é comida do que é brinquedo. Ele brinca com tudo e tudo vai pra boca. Por exemplo: ele adora comer papel. Não pode achar um papelzinho pelo chão que vai para a boca. Acho que ele pensa que alface é o papel que eu deixo ele comer”, brinca Viviane.
A boa experiência levou a mãe a variar e ousar mais na alimentação do filho, o que sempre trouxe ótimos resultados. “Ele come couve, espinafre, agrião, mas tudo misturado e amassado com legumes, então, não dá muito para distinguir o que é folha do que não é. Depois da alface, tinha rúcula na salada e dei para ele. Tive certeza que ele não ia comer porque rúcula é amargo, né? Mas ele comeu. E comeu agrião também”, comemora.
A história do Igor não tem a ver (só) com sorte, mas com o caminho que a família optou por percorrer. Além do contato com os vegetais no momento certo, é importante destacar que quando ele conseguiu acesso à alface, estava na cadeirinha dele, observando o almoço da família – note que a família come salada! – e resolveu brincar com aquele objeto estranho. “Bons exemplos são fundamentais nessa fase. As crianças ‘imitam’ os hábitos alimentares de quem as cerca, e por isso mesmo, a família e a escola são fundamentais no processo de educação alimentar.” “O Igor está sempre de olho no que a gente come. Se a gente come, ele quer também. Acho que deve ser muito difícil fazer uma criança comer comida saudável se os pais comem mal. O Igor come coisas que eu odeio, como fígado, por exemplo, mas são exceções. Toda vez que compro um legume diferente pra colocar na comida dele, faço para comermos também. Nunca tinha comido maxixe, mas comprei para ele e nós também comemos”, diz. “Ter um bebê é uma oportunidade de começar a se alimentar melhor. Parei de tomar e comprar refrigerantes desde que engravidei. Se não tiver Coca-cola em casa, onde é que ele vai aprender a tomar isso?”.

E SE EU DETESTAR LEGUMES?

 “A criança vai sempre olhar e imitar gestos, palavras e frases (quando começar a falar) porque ela entende que o que os adultos vivem é o que ela precisa fazer”. Então, quando os pais dizem a ela para comer algo que eles não comem, isso gera um conflito porque está sendo transmitida uma dupla mensagem.
O ideal seria se mostrar um bom exemplo, aproveitar a chegada do bebê para rever hábitos, valores e crenças, mas se realmente não for possível, o melhor caminho é a sinceridade. Quando a criança for maiorzinha, ela vai entender cada vez mais seu ambiente e não vai adiantar nada fingir que gosta de algo que você não come e muito menos tentar convencê-la disso com base em falsos argumentos.
“A mãe pode dizer ao filho que infelizmente não aprendeu a gostar de ‘cenoura’, por exemplo, mas que gostaria que ele comesse porque é importante. Aí ela pode negociar, colocando um pedacinho no prato dele e no dela para que eles experimentem juntos. A criança pode até não gostar, porque a vida é repleta de sabores e cores e muitos deles não vão agradar mesmo, mas é preciso abrir espaço para experimentar. O que não podemos é tentar enganar uma criança”.
Obrigar, discutir, dar apertões e tornar a hora de comer uma confusão não é nada recomendável e nem é preciso chegar a esse ponto. Para a nutricionista Verônica Mendes, o sucesso da educação alimentar está na repetição, mas é preciso aprender a ler os sinais e a dosar quantidades. “Devemos acompanhar e respeitar a quantia que é aceita, pois a persistência nesta fase é muito importante, mas distinguir entre os caprichos e os limites é essencial para não tornar o momento da refeição uma tortura.”


PASSO A PASSO DA FELICIDADE

É possível moldar o paladar a qualquer momento (ufa!), mas quanto mais cedo o processo for iniciado, melhor. O processo pode começar muito mais cedo do que imaginamos. “Há diversos estudos que associam os hábitos alimentares durante a gestação com as preferências das crianças. Sabe-se que de acordo com determinados alimentos é possível alterar o ‘sabor’ do líquido amniótico, que é fonte de alimentação do bebê na barriga da mãe”.
Isso não significa que se a mãe comer muita acelga durante a gravidez, a criança vai gostar também. A relação não é tão direta, mas, segundo a nutricionista, “o líquido amniótico, que  já é levemente adocicado, pode sofrer pequenas alterações de acordo com a alimentação da mãe, não assumindo as características de  determinado grupo de alimento, mas podendo influenciar as preferências da criança”.
Se a alimentação da mãe não foi muito exemplar durante a gestação e a família não é muito fã de alimentação saudável, ainda existem milhares de alternativas para estimular a criançada a agir do jeito certo. A proposta  é convidar a criança a provar uma nova cor e um novo sabor, desafiar a criança a tentar colocar pelo menos 7 cores no prato, por exemplo. Se não for possível colorir o prato, colorir o copo com um suco saudável também é uma alternativa. A educadora e psicoterapeuta acredita que a alimentação tem que acontecer no campo do afeto, da negociação, mas que o adulto também precisa se impor e não se deixar levar pela manipulação infantil, afinal, ele é responsável pela criança.
Outra atividade interessante é o de inserir a criança no processo de preparo dos alimentos. “Mesmo que ele não goste, ele experimenta porque ele ajudou a fazer, então, vai olhar para o alimento com bons olhos. Ele pode até não gostar de comer maçã, mas como foi ele quem picou, ele vai comer pelo menos um pedacinho”.
Levar a criança para passear no hortifruti também pode trazer resultados surpreendentes. “Transitar nesse ambiente, reconhecer os alimentos num movimento lúdico (de que cor é? Que gosto será que tem? Qual é o nome?) é viver o alimento na relação com esse adulto de forma afetiva e é isso que faz a gente gostar das coisas. É preciso brincar, estabelecer uma relação afetiva, de uma coisa gostosa. Dessa forma, há grande possibilidade de esse alimento chegar no corpo de forma prazerosa“.

Mais Tato

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